ABCIBER | Simpósios e Encontros, II Encontro Regional Centro-Sul da ABCiber

ISSN : 2175-2389
DEVOÇÕES MARIANAS E GOOGLE TRENDS
Leonardo Torres Torres

Última alteração: 2019-03-07

Resumo


O trabalho de Rosa (2017) sobre a ressonância do Imaginário Cultural nas devoções marianas é o ponto de partida deste artigo. A autora, ao longo do trabalho, estuda sobre três hierofanias, ou seja, aparições divinas de Maria: respectivamente, Guadalupe, Aparecida e Fátima. As três aparições possuem cerca de 200 anos de intervalo entre elas, sendo a primeira em 1531; a segunda em 1717; e a terceira em 1917. Além disso, elas ocorreram em lugares diferentes: México, Brasil e Portugal

Para este trabalho, Imaginário Cultural é a ambiência dos seres da cultura. É uma ambiência autorreprodutora e autônoma da racionalidade humana. Nela estão as energias primordiais que eclodem como deuses, mitos, símbolos, narrativas, crenças, ideologias humanas. Aproximando alguns termos: Morin (1992) denomina esta ambiência de Noosfera; e, Jung (2011b) de Inconsciente Coletivo. Tão significativas foram as aparições que elas ainda reverberam durante quase três séculos após o fenômeno. No caso da aparição de Aparecida, Rosa (2017) afirma que sua adoração cresce a cada dia. O número de visitantes no Santuário de Aparecida, em Aparecida, Brasil, é considerável: a autora afirma que cerca de duzentos mil visitantes por final de semana passam pela cidade, que abrigaria o maior templo dedicado a Maria no mundo[1].

As três hierofanias, isto é, aparições divinas de Maria, são de extrema importância para este trabalho, pois foi a partir delas que se iniciou todo o processo cultural das devoções marianas (rituais, crenças, imagens, etc). Rosa (2017) aponta que a primeira ocorreu no México, em 1531. De acordo com a versão católica, Maria foi vista por um índio denominado Juan Diego, em uma colina de Tepeyac. A versão afirma que esse homem ouviu uma melodia suave, cuja origem era ”œuma nuvem branca e sobre ela uma senhora que resplandecia de luz” (ROSA, 2017, p.35).

Surpreso, ouviu-a chamá-lo pelo nome e dizer-lhe que era a verdadeira mãe de Deus. Incumbiu o índio de dizer ao bispo do lugar, dom Juan de Zumárraga, que construísse naquele local um templo para sua veneração. Como era de esperar, o bispo não deu crédito à história. De volta para casa, onde seu tio estava gravemente enfermo, Juan Diego viu nova aparição da Virgem, que lhe garantiu a cura de seu tio. Seguindo instruções da misteriosa senhora, Dieguito foi ao bosque colher flores, embrulhou-as em seu poncho e levou-as à presença do bispo. Era inverno, e qual não foi sua surpresa quando o índio, abrindo seu manto, derrama a seus pés flores frescas e perfumadas. Embaixo das flores, bordada no manto do índio, aparece a figura da Virgem de Guadalupe: tez morena, olhos claros e muito límpidos, vestida como as mulheres da Palestina. Emocionado, dom Zumárraga cai de joelhos diante daquela aparição e, humildemente, acredita no índio. Do México sua devoção foi levada a vários países da Europa e de toda a América Latina. Hoje Nossa Senhora de Guadalupe é também a padroeira da América Latina.[2]

 

Já a aparição brasileira, 1717, a crença católica discorre que três pescadores, chamados João Alves, Domingos Garcia e Felipe Pedroso, foram designados a pescar em homenagem à comitiva do conde de Assumar, que na época estava de passagem pelo local. Os três homens, pescando no Rio Paraíba do Sul, após tentativas fracassadas de pescar qualquer peixe com a rede, lançaram a rede mais algumas vezes e, então, pescaram o corpo e a cabeça de uma estátua, que foi denominada de Nossa Senhora da Conceição Aparecida. Atualmente, de acordo com o Santuário Nacional de Aparecida, para os católicos, Nossa Senhora Aparecida é considerada rainha e padroeira do Brasil, por decreto do Papa Pio XI. Sua data comemorativa é dia 12 de outubro.[3] E, por fim, a crença católica portuguesa conta que Nossa Senhora de Fátima apareceu para três crianças (Francisco, Jacinta e Lúcia), enquanto pastoreavam, em 1918, e pediu-lhes algumas coisas. Uma delas era a meditação do terço pelo fim das guerras. A crença afirma que a aparição se iniciou como um raio cortando o céu, e surgiu uma senhora trajando branco, irradiando luz branca. Após esta primeira aparição, há relatos de ocorrência de outras, em que Fátima aparecia pedindo o mesmo objetivo de rezar pelo fim das guerras. Ela, portanto, foi considerada uma salvadora da humanidade. Rosa (2017), seguindo uma análise da mitologia, da cultura e da psicologia analítica, aponta que o símbolo de Maria surge não à toa, e que este símbolo emerge para dar sentido à vivência dos indivíduos em determinadas épocas. Por vezes, épocas controversas e dificultosas.

Dessa forma, Rosa (2017) aponta que no México, anteriormente à aparição de Guadalupe, o país sofreu grandes dificuldades com as invasões da Espanha cristã. Ou seja, os nativos tiveram que lidar com a invasão de um Deus cristão, rifles, táticas de guerras. Assim, a autora afirma que Guadalupe é também um símbolo de resistência da cultura nativa pagã, visto que a imagem da santa ainda preserva muitos aspectos da antiga crença nativa.  Já o Brasil, na ocasião da aparição, o país vivia o ápice da imigração portuguesa, e com isso, ponto alto da escravidão no país. A autora ainda afirma que no caso de Portugal, o pedido de Fátima estava relacionado com a revolução bolchevique, a Segunda Guerra Mundial e a ideologia marxista. Ou seja, na época em que a Europa se sentia órfã diante da morte e da destruição surge uma mãe salvadora.

Sabendo disso, a pergunta que motiva este artigo é: como a ligação de cunho arquetípico entre as três marias se dá na plataforma digital de pesquisa Google?

A hipótese sugerida é que há uma recorrência e uma relevância das três marias nas datas marianas, significando que o arquétipo da Grande Mãe é constelado, contagiando psiquicamente todos os devotos. Ademais, indicando não somente uma ligação entre as marias, mas também a possibilidade do Google Trends[4] revelar movimentos provindos do Imaginário Cultural.

O método de investigação do artigo consistiu em levantamento de dados quantitativos e qualitativos. Quantitativos baseados em Rosa (2017) e na ferramenta Google Trends, que produz dados de relevância e recorrência de termos pesquisados no portal Google. Qualitativos graças à pesquisa in loco no Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida (Brasil), em datas das cerimônias religiosas.

Para discussão utilizou-se Carl Gustav Jung, Edgar Morin, Malena Segura Contrera, Jorge Miklos, entre outros autores, como Seifter et al. (2010), pioneiros em utilizar o Google Trends como ferramenta de pesquisa científica.


[1] Material dirigido aos jornalistas que visitam o local e evidenciam o registro de 14 de novembro de 2010, quando mais de 200 mil visitantes passaram pelo espaço em um só dia. C.f. Santuario-aparecida (2018).

[2] C.f. A12 (2018).

[3] C.f. AcademiaMarial (2018).

 

[4] C.f. Google Trends (2018).


Palavras-chave


Contágio Psíquico. Devoções Marianas. Google Trends. Mídia Eletrônica. Imaginário Cultural.