ABCIBER | Simpósios e Encontros, Encontro Virtual da ABCiber 2021

ISSN : 2175-2389
BBC News Brasil: produção de conteúdo na pandemia e linguagem jornalística no Instagram
Lorena Borges Oliveira, Adriely Santana Carvalho, Rita Virginia Argollo, Julianna Nascimento Torezani

Última alteração: 2021-08-24

Resumo


Pensar o jornalismo no século XXI é refletir acerca de tecnologias e convergência midiática. Com a popularização das mídias digitais, os modelos econômicos passam por uma reconfiguração significativa e os veículos são obrigados a adaptar suas rotinas produtivas a necessidades e exigências do público e do mercado. A ascensão da internet leva uma parcela considerável de indivíduos a uma imersão crescente no mundo on-line, pois a rede demonstra uma possibilidade infinita de reunir respostas para, aparentemente, qualquer dúvida. Atrai diariamente inúmeros usuários que compartilham seus questionamentos com o Google. Entretanto, a ideia de um buscador gratuito esbarra na perspectiva de lucro, na qual a plataforma está inserida. Dessa maneira, a capitalização se baseia nos dados disponibilizados compulsoriamente e repassados a anunciantes. Essa lógica comercial está a serviço do Big Five, um conglomerado tecnológico formado por Microsoft, Apple, Facebook, Google e Amazon, que detém a hegemonia do mundo virtual (MOROZOV, 2018). Nesse sentido, este estudo tem como foco a rede social Instagram, criada em 2010. Com funcionalidades em constantes atualizações, oferece aos usuários uma experiência que induz ao consumo. Desde o advento da Web 2.0, sobretudo com a proliferação de redes sociais, o indivíduo se viu como criador de conteúdo e não mais apenas como um consumidor passivo de informação. Essa lógica também afeta a produção jornalística, bem como o interesse por informações pautadas na instantaneidade. Nesse contexto, os valores-notícia se adequam ao espaço digital focado no imediatismo. Como sugere Silva et al. (2020), o algoritmo dessas plataformas valoriza a quantidade, deixando a qualidade em segundo plano. Um conteúdo que circula para mais pessoas não necessariamente será o de maior credibilidade. Concorrentes disputam a atenção de consumidores a cada segundo e por meio das mais diversas dinâmicas, conformando uma linguagem para os veículos de notícia.

Com a pandemia da COVID-19 e a implementação de medidas de distanciamento social físico, esse panorama de consumo com base em dados intensifica. A preferência pelo que está disponível no ciberespaço se altera à medida em que a população convive menos com o mundo externo, recorrendo a recursos on-line para trabalho, estudo ou lazer. É indiscutível que o tempo de tela, para a população que tem acesso, aumentou. Bem como o consumo de informações em rede ganhou força e a conexão de internautas a redes sociais digitais de empresas de notícias em busca por entender a intensa crise que abate o planeta se tornou preponderante. Meios de comunicação passaram a focar neste segmento mais rápido do que talvez planejassem. A atual crise explicitou a importância do jornalismo nas redes sociais. Diante de uma infodemia, o acesso a fontes consideradas confiáveis ganha força. Por isso, o objetivo desta análise é compreender como a cultura de convergência (JENKINS, 2008) afeta a circulação de informações em diferentes esferas midiáticas, além investigar como o capitalismo de dados também transformou a linguagem jornalística e a forma de escoar notícias, principalmente a partir da pandemia do coronavírus. Assim, temos como base teórica os conceitos de capitalismo de dados e regulação algorítmica (MOROZOV, 2020), cultura da convergência (JENKINS, 2008), plataformização (VALENTE, 2020), datificação (MARTINS; VALENTE, 2019), experiência algorítmica (LEMOS; PASTOR, 2020), notícia e valor-notícia (TRAQUINA, 2005). Essa reflexão faz parte de uma investigação mais ampla e compõe o projeto de pesquisa Produção Jornalística em Redes Sociais Digitais, vinculado ao Curso de Comunicação Social (Rádio, TV e Internet) da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), em Ilhéus (BA). A relevância deste estudo se sustenta, entre outros elementos, na compreensão do é jornalismo na contemporaneidade diante da imposição por adequar as produções a públicos, plataformas e linguagens, como memes, por exemplo. É fundamental entender como estão sendo adequadas as produções para o contexto do distanciamento e os formatos das redes sociais. Também compreendemos que esta análise nos possibilita perceber as atuais formas de consumo de informação, considerando as relações mercadológicas nas quais os usuários estão inseridos. Desse modo, o percurso metodológico foi delineado no sentido de analisar o perfil da BBC News Brasil no Instagram no período de 15 a 31 de março de 2020, buscando notar as adaptações feitas e o modo como a referida empresa estruturou suas publicações no momento inicial da pandemia. As postagens sobre COVID começaram no dia 16, sendo diárias, com exceção para os dias 18 e 22. Alguns dias houve mais posts sobre o tema, seja tentando explicar o que é o vírus, a situação de Wuhan (onde a contaminação começou) ou sobre os embates políticos em torno da questão. Os recursos oscilam entre cards, vídeos e fotos com insert de texto, além do uso de hashtags e da regularidade de publicações para o engajamento na plataforma. No perfil, observamos o uso de hiperlinks redirecionando ao portal da BBC.

Lemos e Pastor (2020, p. 137) afirmam que ”œé importante analisar o Instagram não apenas como uma rede social digital, mas como uma plataforma [...] que agrega diferentes serviços, em uma economia desenvolvida e guiada por dados e através da organização algorítmica da experiência”. Essa rede vai além do diário pessoal, conecta consumidores a produtos, serviços e empresas, e adentra cada vez mais a vida cotidiana em um processo denominado plataformização (SILVA et al., 2020). Anunciar, comprar e informar se ancoram na produção e coleta massiva de dados, a datificação, e possibilita a expansão das plataformas, que estimulam a produção desenfreada desses dados para posterior análise (MARTINS; VALENTE, 2019). O perfil do usuário é formulado a partir das informações processadas sobre seu comportamento na internet, suas preferências, sites visitados, desejos etc, resultando em uma experiência muito mais personalizada e imersiva. Frente ao grande número de usuários, acúmulo excessivo de dados e desenvolvimento de novas tecnologias, surge o fenômeno que Valente (2020, p. 83) chama de monopólios digitais, resultado do fato de que ”œas plataformas potencializam sua capacidade de conexão entre lados partindo do domínio de mercado em nichos especí­ficos e do controle de segmentos da Internet diversificando suas atividades”.  O Instagram, com mais de 1 bilhão de usuários e um amplo armazenamento de dados, se estrutura como um desses monopólios, com capacidade de determinar práticas de mercado. Nessa perspectiva, as prioridades empresariais são reformuladas: a presença nessa rede se tornou importante para o crescimento, desenvolvimento e lucro das marcas, obrigadas a se adequar a outras formas de vender seus produtos, engajar seus conteúdos e alcançar clientes. Com a indústria de notícias esse processo não foi diferente.

Convergência de mídias, linguagens e formatos torna o Instagram um desafio para veículos consolidados no modelo broadcasting. Comunicar nas redes exige uma linguagem que difere do jornalismo televisivo: a rede é dinâmica. Outra questão importante a respeito das adaptações do jornalismo para as redes se refere à autonomia do usuário ao escolher o que deseja ou não ver enquanto navega pelo feed ou assiste aos stories, fazendo com que os produtores de notícias pensem em estratégias adequadas para reter a atenção do usuário, afinal ”œem meio a uma miríade de sites, aplicativos e fluxos informacionais, a atenção do usuário e consumidor se torna objeto de disputa intensa” (MARTINS; VALENTE, 2020, p. 87). Essa lógica também se baseia no fluxo de algoritmos do próprio Instagram, que conduz os sujeitos para a navegação no que a plataforma considera pertinente, seja omitindo do feed alguns perfis, seja lhes mantendo reféns de bolhas informacionais.

Palavras-chave


Jornalismo; Redes Sociais; Instagram; Pandemia; Plataformização

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