A parceria do jornalismo na discussão do meio ambiente na escola básica de Portugal
Palavras-chave:
Jornalismo e meio ambiente, educação ambiental, ensino básico, Referencial de Educação Ambiental, Educação em PortugalResumo
Incêndios florestais e chuvas torrenciais com inundações colocam em risco toda a vida do ecossistema, que já vive a perda de espécies e de patrimônios. Esse é o cenário que acompanhamos há anos e que se intensifica a cada período. Impossível não associar esses fatos a uma resposta do planeta frente ao grave desgaste que vem sofrendo de suas populações. A solução não é nada fácil e a conscientização pode começar com crianças e adolescentes. Nesse sentido, perguntamos como a escola básica vem reagindo a esses problemas? Como o jornalismo, sendo parceiro em levar informação, tem participado dos trabalhos no ensino básico? É essa a discussão que pretendemos abordar com este artigo, analisando as ações de Portugal na perspectiva da sustentabilidade na educação. A metodologia contempla revisão bibliográfica, com autores ligados aos temas; e análise documental do Referencial de Educação Ambiental para a Sustentabilidade direcionado a Educação Pré-Escolar, Ensino Básico (ciclos 1, 2 e 3) e Ensino Secundário desse país, emitido em 2018; assim como estudo do relatório “Perfil dos Alunos – Acompanhamento do Trabalho das Escolas”, na perspectiva do Referencial.
Introdução
Um dos maiores desafios da humanidade é o enfrentamento das alterações climáticas (Cartea, 2010), cujos resultados já se verificam em várias partes do mundo, como os incêndios florestais na Europa e Canadá, nos últimos anos (Esa, 2023). No Brasil, o incêndio também atinge o Pantanal (Altino, O Globo, 2024) e a seca vem sendo uma frequente na Floresta Amazônica, o maior ecossistema verde do planeta, que também enfrentou o fogo no início deste ano (Agência Brasil, 2024). Portugal viveu recentes momentos de tensão por queimadas em setembro/2024, com incêndios na região central do país, provocando até mortes, como destaca reportagem do Público Online (2024). Cartea (2010) reforça que os maiores obstáculos para se obter uma política de resposta eficaz residem no fato de ser um “problema multicausal”, compreendendo aspectos ligados ao modo de produção e de consumo das sociedades mais avançadas. Para o autor, a urgência de uma política pública voltada à questão ambiental deve ser pensada para outras sociedades. E sendo ela qual for, precisará que as populações mais avançadas (do ponto de vista econômico) se voltem às “energias fósseis e aos dogmas mercantilistas e de desenvolvimento que defendem um crescimento ilimitado” (Cartea, 2010, p11).
Enfrentar os desafios depende da cooperação de toda a sociedade, mas esta necessita de informação e conhecimento capazes de gerar uma consciência ambiental. Nesse sentido, este artigo analisa a participação de Portugal, no incentivo à escola básica na perspectiva da preservação do planeta, e como o jornalismo colabora com esse esforço, para implementar projetos de sustentabilidade. O recorte, portanto, está na análise do Referencial de Educação Ambiental para a Sustentabilidade direcionado a todos os níveis da escola básica, e do ensino secundário, e no documento Perfil dos Alunos – Acompanhamento do Trabalho das Escolas –, ambos produzidos pelo Ministério da Educação de Portugal, por meio da Direção Geral de Educação (DGE).
Para compreender a participação da mídia, destacamos algumas organizações, como: a Agência Espacial Europeia (European Space Agency- ESA), que vem chamando a atenção para o aumento das temperaturas globais que está provocando numerosos incêndios florestais. O Observatório dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS)[1], de responsabilidade da Católica Lisbon School of Business & Economics[2], que monitora a implementação da Agenda 2030 e as práticas de comunicação sustentável em empresas portuguesas. E o Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS) da Universidade do Minho[3][4], do qual, um dos seus principais temas de investigação é Território e Ambiente. Todos, cada um a seu modo, atuam na perspectiva da conscientização das sociedades para os cuidados na preservação do planeta.
O Referencial de Educação Ambiental para a Sustentabilidade é direcionado a Educação Pré-Escolar, Ensino Básico (ciclos 1, 2 e 3) e Ensino Secundário de Portugal. Está inserido no “conjunto de referenciais preparados pela Direção-Geral da Educação (DGE) no âmbito da Educação para a Cidadania” (2018, p. 5). Nesse conjunto, podemos destacar o Referencial de Educação para os Media, que orienta as escolas sobre como trabalhar a literacia e a educação para o uso correto e responsável dos recursos da mídia. Dispõe de 10 pontos de seu objetivo, entre os quais, a interface da comunicação e da educação e a aplicação de práticas jornalísticas. O Referencial de Educação Ambiental pode ser aplicado na sua totalidade ou em partes, por meio de projetos e iniciativas que visem a formação dos alunos na perspectiva da sustentabilidade. Pretende-se promover o conhecimento do aluno para interpretar e avaliar o contexto do meio ambiente e ações em defesa do ecossistema.
Como explicitado por Silva (2016), essa questão já faz parte da Constituição da República Portuguesa (CRP)[5]. Em relação ao cidadão, a CRP traz no artigo 52.º, n.º 3, alínea “a” que este tem como um direito de participação política o direito de petição e de ação popular por meio do qual pode “promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções contra [...] a qualidade de vida e a preservação do ambiente” (PORTUGAL, 2015a).
Referencial de Educação Ambiental de Portugal
O documento emitido pala DGE estabelece algumas frentes, como a de transição para uma economia verde, com a descarbonização, reduzindo as emissões de gases de efeito estufa; a eficiência energética, com a redução do consumo de energia; e economia circular, com um modelo econômico que possa reduzir o desperdício, a partir da reutilização e reciclagem de materiais. Outras frentes seriam a proteção da biodiversidade, em defesa de populações (como as indígenas), habitats naturais, ecossistemas frágeis e espécies ameaçadas de extinção; o combate ao tráfico de animais e plantas; a recuperação de áreas degradadas; o esforço no combate à poluição, por meio do controle de emissões de poluentes atmosféricos; o tratamento de esgoto e gestão de resíduos sólidos; e a cooperação internacional, com acordos entre os países, transferência de tecnologia e cooperação científica (Araújo, Silva & Ribeiro, 2020).
O referencial para a sustentabilidade da Educação de Portugal foi produzido pela DGE no âmbito da Educação para a Cidadania. Outro documento, cujas informações também fundamentarão este artigo, é o do Conselho Nacional de Educação português, intitulado Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS).
Rosa (2011) reforça que a educação para o desenvolvimento se tornou “uma prioridade e passou a estipular de uma forma inequívoca que é fundamental criar conhecimento e sensibilizar a opinião pública portuguesa para as temáticas da cooperação internacional e para a participação ativa na cidadania global” (2011, p. 49). O documento da DGE avança nesse sentido, poise orienta as escolas para a sustentabilidade de forma mais abrangente no âmbito da cidadania, como um processo de sensibilização para valores e atitudes comportamentais na perspectiva do desenvolvimento sustentável. Recomenda ainda que a educação ambiental seja inserida no currículo escolar, como forma de fomentar projetos a serem apoiados pelo Ministério da Educação.
Na cooperação entre as tutelas do meio ambiente e da educação, Portugal assume compromissos com a União Europeia, com reforço das capacidades de intervenção das entidades públicas a partir dos termos de transversalidade de atuação e cooperação interministerial. A estrutura do Referencial está organizada por níveis e ciclos de ensino e se estabelece como um orientador para que a educação para a cidadania seja implementada desde a pré-escola. Possibilita com isso, introduzir temáticas transversais que levam a mudanças de comportamento de crianças e jovens na perspectiva da preservação do meio ambiente.
A participação do jornalismo na educação
Embora o jornalismo não seja diretamente mencionado no Referencial de Educação Ambiental, podemos percebê-lo nas orientações às escolas. O apoio da comunicação e de práticas jornalísticas, como pesquisa, apuração de dados e entrevistas, necessário para colocar em prática as ações de sustentabilidade, facilita o trabalho de identificação de temas globais, subtemas, objetivos e descritivos de desempenho da educação.
Um exemplo desse trabalho é projeto Setubal na Rede[6], oferecido em onze escolas e agrupamentos do primeiro ciclo ao secundário, em Portugal. Por meio de workshops e do envolvimento de professores, os alunos se tornam jovens repórteres e são formados para se tornarem “bons consumidores de informação”. No Brasil, o projeto Memórias em Rede[7], criado em 2018, atua em perspectiva semelhante. Ancorado pela teoria do educador Paulo Freire dos círculos de cultura (2011), levando aos alunos do ensino Fundamental II, a oportunidade de identificação da escola com o meio ambiente, por meio de práticas jornalísticas educomunicativas, “relacionadas a memórias e à história de vida desses alunos. As atividades acontecem dentro e fora da escola e têm como base a atividade jornalística” (Rocha & Paulino, 2023, p. 107).
Considerações finais
No caso do Referencial de Educação Ambiental, a presença do jornalismo pode ser identificada em relatórios informativos dos alunos, em canais de comunicação como podcast, vídeos, fotografias e jornais impressos ou online.
Crianças e jovens do ensino básico, motivados pelo jornalismo, trabalham a literacia e a educação midiática em cada uma das disciplinas, reunindo os temas sustentabilidade, ética e cidadania; produção e consumo sustentáveis; território e paisagem; alterações climáticas, biodiversidade; energia; água, solos. E ainda se deparam com subtemas, como pilares da sustentabilidade, ética e cidadania, responsabilidade intergeracional, entre outros.
Pelo documento do DGE de Portugal, cada tema e subtema possui sugestões sobre quais níveis de ensino podem ser utilizados. Por exemplo, sustentabilidade, ética e cidadania, podem ser trabalhados desde a educação pré-escolar.
[1] Disponível em https://www.observatorio-ods.com/
[2] Disponível em https://www.clsbe.lisboa.ucp.pt/pt-pt/catolica-lisbon-school-business-economics
[3] Disponível em https://www.cecs.uminho.pt/
[5] Disponível em: https://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx
[6] Disponível em: https://www.setubalnarede.pt/
[7] Disponível em: https://www.devireducom.org.br/mem%C3%B3rias-em-rede